Enquanto o ABC paulista perde seis escolas estaduais e outras 30 não terão aulas noturnas, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), investe na reforma dos Centros de Detenção Provisória (CDPs) regionais. As unidades prisionais de Santo André, São Bernardo e Mauá, com superlotação que ultrapassa três vezes o limite da população carcerária, receberam investimento para reparos estruturais, sem qualquer previsão de ampliação. Nas últimas manifestações de rua contra a reorganização escolar, a população levantou o bordão “fecha escolas, ergue prisões”, como forma de criticar as políticas públicas do estado.
Especialistas em segurança e educação ouvidos pela reportagem argumentam que, ao abandonar a educação formal, o estado contribui para o aumento da população prisional. De acordo com a Secretaria da Administração Penitenciária, no ABC, a unidade de São Bernardo é a que possui a maior superlotação. Com capacidade para 844 pessoas, atualmente 2.401 estão instaladas no CDP, que fica no Bairro Cooperativa. Em Santo André, o CDP na Vila Palmares comporta 534 prisioneiros, porém, a unidade abriga 1.874. O terceiro centro de detenção, em Mauá, tem quase 1.500 pessoas, sendo que a capacidade é de 624.
A tendência é que a situação não se altere. “Historicamente, nossas prisões são depósitos de gente. Quando o jovem não tem acesso à boa educação, à cultura e ao lazer, perde formação e oportunidades de se inserir no mercado de trabalho”, analisou a professora da Universidade Federal do ABC (UFABC) Alessandra Teixeira, doutora em Sociologia e pesquisadora do Observatório de Segurança Pública da Unesp. Segundo ela, o adolescente prejudicado pela precariedade da educação pública acaba absorvido pela criminalidade. “O jovem vira mão de obra para o crime organizado, e o primeiro contato que ele terá com a carceragem será o CDP”, salientou.
Para Alessandra, construir ou fechar prédios não pode ser indicador de política pública. “As verbas para a segurança e educação são diferentes. Mas, ao fechar escolas, o governo contribui para um ciclo que gera a mão de obra para o crime organizado. Assim que o jovem ingressar na cadeia, os grupos criminosos vão captar essa pessoa, que poderia ter uma possibilidade de evitar essa situação se tivesse acesso a uma boa formação escolar”, reforçou a professora. “O jovem sem acesso à educação e a população prisional são o mesmo público”, reforçou.
Água de chuva
O governo estadual, por meio da Secretaria de Administração Penitenciária, informou que “o Centro de Detenção Provisória (CDP) de Santo André está em reforma para a ampliação da captação de água da chuva e armazenamento em reservatório de 5 mil litros, confecção e instalação de um novo portão de entrada da unidade, reforma de cela destinada a pessoas com necessidades especiais, setores de subportaria e portaria passando por adaptação para melhor acessibilidade e instalação de mictórios e lavatórios nas torres de vigilância. Os custos somados tem valor estimado de R$ 39.442”.
Já o CDP de Mauá “está em obras para a alteração dos portões de acesso aos pavilhões habitacionais, com custo estimado em R$ 5.100,00”. No caso de São Bernardo, os valores e detalhamentos da No caso de São Bernardo, os valores e detalhamentos da obra não foram informados.
O coordenador do curso de Pedagogia da Fundação Santo André, Sebastião Porto, também é um dos críticos das medidas adotadas pelo governo Alckmin. A reorganização escolar, conforme o docente, foi feita sem transparência e participação da população e especialistas em educação. “Claro que sempre precisamos reorganizar e melhorar nossas escolas. Mas isso tem de ser feito ouvindo pais, alunos, professores e especialistas na questão. Isso não acontece no governo de São Paulo”, argumentou o professor, que já foi funcionário da Secretaria da Educação estadual.
Porto também acredita que o processo de precarização da educação de base pode contribuir com o aumento da criminalidade. “Concordo com os movimentos de rua. Esse link existe, é evidente”, salientou. O professor chama atenção também para a falta de compromisso do estado com os professores da rede básica. “Ao fechar escolas e salas de aula, o governo do estado deixa de lado o professor, o profissional que participou de uma atribuição de aulas para trabalhar mais próximo de casa e agora se vê obrigado a se deslocar para mais longe”, explicou.
“A ampliação do acesso à escola pública é um acontecimento recente no nosso país. Por outro lado, temos uma das maiores populações carcerárias, e esses fatos estão ligados”, sustentou. “Essa ligação é quase óbvia. Temos uma educação deficitária que não consegue trabalhar uma série de valores e princípios. Isso tem um reflexo na população carcerária.”
Fonte: Rede Brasil Atual