O calcanhar do sistema

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O CALCANHAR DO SISTEMA…
(*) Amauri Meireles

As recentes ameaças à sociedade carioca (incêndio de veículos, bloqueios de vias, pilhagens via-arrastões, ataques a órgãos de segurança) retratam a fragilidade do sistema de administração prisional brasileiro: ordens, de chefes para braçais do tráfico, teriam partido de presídios de segurança máxima; marginais, travestidos de advogados, aproveitando-se de circunstâncias favoráveis na legislação penal (contato direto com presos, recebimento de correspondência, inexistência de revistas pessoais) teriam sido os mensageiros; outra hipótese seria quando da visita de familiares e as íntimas; minimamente, a entrada de celulares e drogas em estabelecimentos penais parece uma infindável brincadeira de gato e rato; rastreamento eletrônico, bloqueadores de comunicações ainda não mostraram eficácia; enfim, falta doutrina para a atividade.

E a videoconferência, sem unanimidade, não vem sendo utilizada. Os apressados culpam os agentes prisionais: ?incompetentes e corruptos?. Fora uma minoria que envergonha a classe (como há em todas as profissões), quase a totalidade é integrada por homens e mulheres honestos, interessados, prestativos e eficazes, cuja atividade, pela Organização Mundial de Saúde, é considerada uma das mais estressantes no mundo.

A desinformação tem gerado conclusões apressadas e inconseqüentes, pois, a fragilidade do sistema de administração prisional tem origem fora dos estabelecimentos penais: modelo de gestão e legislação. Os presídios federais caminham para se tornarem órgãos-modelo: agentes de ótimo gabarito, concursados, treinados, bem remunerados, recursos tecnológicos na administração e na logística, instalações vitais muito bem concebidas e protegidas, trabalho primoroso, etc. Porém, nos estabelecimentos estaduais, o caos ainda não se estabeleceu exatamente em razão do trabalho dos agentes prisionais. Quem é do ramo sabe, são eles que, efetivamente, ?seguram a cadeia?.

O sistema de administração penal é o aquiliano calcanhar no sistema de salvaguarda social (segurança pública), integrante do sistema de defesa social: pelo equivocado estigma gerador de desatenção estatal, pela gestão inadequada, por falta de profissionalização da atividade (deveres e garantias estão indefinidos, por não haver plano de carreira, as diretorias de estabelecimentos penais, em maioria, são transformadas em sinecuras, ocupadas por apaniguados), por não se investir no profissionalismo (indicações da parcela do poder/força a ser exercido pelo pessoal envolvido), pela estrutura obsoleta (por exemplo, inexiste órgão institucionalizado de inteligência policial prisional, pelo arremedo de ressocialização). Então, por que não se corrige essa distorção se, inexoravelmente, o preso vai pra lá? Por miopia política!

No Congresso, está para ser votada e promulgada a PEC-308, que reconhece normativamente a Polícia Penal, que já existe de fato. Uma análise isenta de custo/benefício irá constatar que o Brasil está atrasado nesse quesito, ao contrário de outros países que já estruturaram essa polícia. Entretanto, os estreitos de visão enxergam a PEC como um pleito classista e não um avanço na proteção social; ela é esconjurada pelos adeptos da terceirização, que não ocorrerá, na atividade-fim, se se reconhecer que a custódia de presos é feita embasada no poder de polícia.

Enfim, é o interesse de alguns se sobrepondo ao interesse social. Até quando?!…

(*) Ex-Comandante da Região Metropolitana de BH
Ex-Superintendente da Guarda Prisional de MG

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IMPRENSA SINDASP-SP
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