Privatizar as unidades prisionais é reconhecer o fracasso de administrá-las

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 ARTIGO                                                                                                

 

Privatizar as unidades prisionais é reconhecer o fracasso de administrá-las

 

O que levou o governo a desejar abdicar-se do sistema penitenciário a não ser a hipótese de fracasso em administrar as unidades prisionais?

 

 

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(*)  Carlos Vítolo

 

O governador Geraldo Alckmin anunciou o ano passado que pretende privatizar a administração de três unidades prisionais por meio da Parceria Público-Privada (PPP) na região metropolitana de São Paulo. Juntas, as três unidades terão capacidade para 10,5 mil presos, sendo 3,3 mil vagas para o regime semiaberto e 7,2 mil para o fechado. Certamente as unidades servirão de cobaias para um projeto que deverá privatizar as prisões em todo o Estado.

 

A iniciativa privada será a responsável por construir e administrar o complexo penitenciário formado pelas três unidades, enquanto que o governo fará a fiscalização e pagará um valor mensal por cada preso no período que deve durar entre 27 e 33 anos. Após o vencimento desse prazo, as unidades serão repassadas para a administração pública.

 

Atualmente o Estado gasta em média R$1.350 mensais por preso e apesar de ainda não existir nenhuma definição de valores a serem investidos, certamente, para que a iniciativa privada assuma a construção e administração dos presídios, esses valores serão infinitamente maiores, já que obviamente as empresas visam o lucro com as prisões.

 

Apesar de o governo estar trabalhando para privatizar as unidades, a entrega do preso à iniciativa privada é inconstitucional para nossa legislação, tendo em vista que é dever do Estado executar a pena dos presos e essa função punitiva é indelegável. A punição não é atividade econômica e para que o sistema prisional seja privatizado se faz necessário uma nova Constituição.

 

No entanto, a privatização é um bom negócio tanto para o governo quanto para a iniciativa privada. Ao transformar o sistema prisional em mercadoria, o governo passa a “batata quente” para o primeiro que achar pela frente e se livra de um pesado fardo. Enquanto isso, a iniciativa privada lucra com o encarceramento de massa, fato que deverá gerar uma superpopulação carcerária ainda maior do que a que já existe nas unidades do Estado.

 

Se não é para se livrar, então qual seria o motivo que levou o governo a desejar abdicar-se do sistema penitenciário? Nada justifica tal decisão, a não ser a hipótese de fracasso em administrar as unidades prisionais.

 

Ao invés de privatizar as unidades, não seria mais inteligente se o governo fizesse uma reforma completa no sistema prisional, começando por dar condições de trabalho mais dignas aos agentes de segurança penitenciária? Tais servidores são tão esquecidos nos fundos das cadeias do Estado, que nem mesmo têm um fardamento para exercerem suas funções e a única arma que possuem é uma chave que abre as portas das celas. Aliás, certamente a sociedade não sabe, mas todos os dias, em todas as unidades do Estado, um agente penitenciário entra sozinho em um raio com diversas celas e mais de 400 presos, portando apenas uma chave, e abre cela a cela, totalmente vulnerável, colocando a vida em risco. São incontáveis os casos de agressões sofridas por agentes dentro das unidades. E será que o governador não sabe disso? Certamente que sabe, mas parece que a privatização é mais importante e lucrativa. É necessário que o agente penitenciário tenha o efetivo poder de polícia, mas para isso, antes, é preciso que o governo se interesse pela categoria e, por exemplo, crie um projeto de lei para tal, transformando os agentes penitenciários em Polícia Penitenciária ou Polícia Penal do Estado de São Paulo, reconhecendo a categoria constitucionalmente, pois nem isso ela é.  

 

É realmente inaceitável a delegação da administração prisional à iniciativa privada. Não é a iniciativa privada que irá tornar o sistema prisional mais funcional e eficiente. As experiências de privatização de presídios no Brasil não são nada exemplares, basta olharmos para a recente ocorrência no sistema carcerário do Maranhão, em Pedrinhas, que é privatizado e que o governo disse ter investido 131 milhões em melhorias nos presídios, mas que no entanto, a privatização envergonhou o Brasil na imprensa internacional. Outro exemplo de privatização é o Complexo Penitenciário Público Privado (CPPP) de Minas Gerais, localizado em Ribeirão das Neves, na Grande BH, onde ocorreu uma fuga cinematográfica e um detento escapou em uma trouxa feita com uniformes confeccionados na unidade. O detento foi levado até o veículo usado no transporte das confecções e que pertence à empresa parceira do Estado.

 

Gostaria de saber com que poder os funcionários das unidades privatizadas atuariam, já que não representam o Estado e poderiam agir somente em flagrante delito. A iniciativa privada, para economizar e aumentar ainda mais o lucro, busca reduzir o quadro de funcionários, pagar um piso menor e minimizar ao máximo os benefícios dos trabalhadores das unidades. Pedrinhas e Ribeirão das Neves são excelentes exemplos para que o governo de São Paulo abra os olhos e tome consciência de que a privatização não funciona.

 

Por fim, ao invés de privatizar as unidades prisionais, seria melhor que o Estado fosse mais eficiente e cumprisse sua função constitucional para que o sistema penitenciário não fosse o caos que é. 


 

(*)  Carlos vítolo é jornalista profissional com formação acadêmica, graduado em Comunicação Social – Bacharel em Jornalismo; Assessor de Imprensa do Sindasp-SP; Professor universitário; Filósofo e teólogo; Atualmente cursando mestrado em teologia exegética e marketing político.

 

Veja imagens da rebelião ocorrida no Complexo Penitenciário Privado Advogado Antonio Jacinto Filho (Compajaf) em Aracajú-SE.

 

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