Presos podem fumar no interior dos estabelecimentos penais do estado de São Paulo, mas funcionários estão proibidos de fazer uso do cigarro nas prisões, informou a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado.
A lei que proíbe o cigarro em ambientes de uso coletivo – privados ou públicos – em todo o estado entrou em vigor nesta sexta-feira (7).
O texto da legislação diz apenas que ‘os estabelecimentos prisionais e as unidades de cumprimento de medidas socioeducativas se sujeitarão às normas próprias de execução penal’.
De acordo com a assessoria da secretaria, os presos não precisam seguir a lei antifumo porque já têm a liberdade restrita.
‘O fato de a lei antifumo não ser aplicada nos presídios é justamente pelo fato desse tipo de população já estar sujeita a regras de restrição de conduta, ou seja, por não estar em liberdade. É importante lembrar que os funcionários dos presídios não poderão fumar, apenas os presos (não existe proibição)’, disse a assessoria por e-mail.
Atualmente, segundo a Secretaria da Administração Penitenciária, São Paulo tem cerca de 150 mil detentos, que representam aproximadamente 40% da população carcerária do país.
Para cuidar desse contingente, há 23 mil agentes penitenciários, de acordo com o Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de São Paulo. A entidade estima que 40% dos servidores sejam fumantes.
Agentes penitenciários
Para Daniel Grandolfo, diretor do sindicato, os servidores serão prejudicados com a medida.
‘Eu acho que tem que valer para todo mundo. Se vale para preso, tem que valer para todo mundo. Preso pode fumar à vontade, dentro das celas, e inclusive prejudicar os outros presos. Então, eles deveriam permitir o cigarro só no pátio externo.’
Grandolfo diz acreditar que cerca de 80% dos presos no estado fumam. Ele disse que, mesmo considerando que a lei deveria ser para todos, administrar a restrição também para os detentos seria ‘inviável’.
‘A lei é linda, seria muito bacana. Sou a favor da lei, mas reconhecemos que não tem como aplicar. Eles fumam em todo lugar, dentro das celas, no pátio de sol. A gente trabalha num ambiente altamente insalubre, é só fumaça. Você chega perto da cela e vem uma nuvem de fumaça.’
Dificuldades para aplicar
Na avaliação do presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Mário de Oliveira Filho, o fato de a lei não valer para os detentos ‘mostra que o governo não tem condições de cuidar de quem está preso’.
‘Seria impossível com essa administração penitenciária que temos restringir o cigarro. É absurdo pensar nisso porque o cigarro na cadeia é mais que vício, é moeda de troca. É uma demonstração da inoperância do estado em gerir assuntos do sistema penitenciário.’
A assessoria da Secretaria de Justiça afirmou que o objetivo de isentar os detentos do cumprimento da lei foi manter as regras já existentes para não tornar mais difícil a vida do preso.
O advogado criminal e professor de direito penal da Universidade de São Paulo (USP) David Teixeira de Azevedo concorda com a decisão do governo de não incluir os presos.
‘Apesar de ser uma instituição de segurança pública, é uma espécie de misto, porque é também domicílio do réu, do condenado. E a lei não pode ter interferência de alcançar a privacidade no domicílio da pessoa. Uma cela é um local público, mas é de habitação também.’
Além disso, o professor destaca que a restrição poderia causar revolta entre os presos. ‘É incontrolável. Já se faz vista grossa a muitas coisas porque senão a cadeia fica de difícil controle. Acho que, se proibisse, a cadeia explodiria. Mesmo se fosse só no pátio, não iria satisfazer os fumantes inveterados.’
Gradativamente
O coronel José Vicente da Silva Filho, ex-secretário nacional de segurança, concordou com o professor, mas disse ser favorável à aplicação da lei gradativamente.
‘Medidas que mexem com a população carcerária devem ser tomadas com cautela. São hábitos, não são infrações. Deveriam ser impostas sim, mas com gradualismo maior do que no ambiente externo.’
Silva Filho considera ‘adequada’ a decisão do governo paulista. Para ele, a condição dos servidores é diferenciada em relação à dos presos porque eles estão em ambiente de trabalho.
Jornalista: Mariana Oliveira
Do G1, em São Paulo